Voltei para Florença no sábado, pela manhã, com meu pai. Já fazia um tempo que não viajávamos juntos, então lembramos mais uma vez de quando toda a nossa família viajava junta. Era impossível não lembrar de mamãe e de Otto quando se passava muito tempo ao lado de papai. Ele parecia já ter superado tudo aquilo há muito tempo, mas já não era mais feliz vivendo só comigo. Pensei em arranjar uma mulher pra ele, uma mulher de verdade, muito melhor que mamãe. Ele merecia. Quando chegamos a casa, Adolfo, o nosso motorista, levava nossas malas para nossos respectivos quartos, enquanto eu e papai ficamos conversando na sala de estar. Eu não queria falar sobre minha noite com meu pai, mas eu sentia que ele devia saber. - Pai, ontem à noite... - Eu sei, Sartori estava no hotel, não é? Como foi a noite de vocês? - Érh... ele conversou com o senhor?! - É claro! Sartori me ligou enquanto você estava a caminho de Roma. Conversamos sobre isso, e bom, eu confio em Sartori, tenho certeza que ele tomou as devidas providências. Não se preocupe, uma hora iria acontecer, não é? Ouvir aquilo de meu pai era assustador. Ele sempre foi compreensivo comigo, mas nunca imaginei que essa compreensão chegaria a tal ponto. Então, ele já sabia da novidade. Quem ainda não sabia era Giovanna. Iria ligar pra ela quando... Interrompendo minha reflexão, Dorotta surgiu pela sala. Lembrei-me que dispensei o seu café da manhã especial. - Oh, Vicent! Não sabe como fico angustiada quando essa casa está vazia! - Dorotta! E você não sabe como sinto falta de seu chá de hortelã. E... ahn... receio que Elisa dispensou o seu presente de aniversário, certo? – Papai nunca dava tempo para as pessoas responderem, continuou imediatamente – Prepare outro agora! E ela vai comer como um javali! Papai e suas comparações. - É Dorotta. Me desculpe, você sabe que não daria tempo! Com um sorriso no rosto e virando as costas para eles, subi as escadas – correndo, quase caindo no último degrau -, entrei em meu quarto, me joguei na cama e liguei para Giovanna. - Alô? – Giovanna atendeu. - Gio? - Ah, oi Elisa – parecia distante. - Giovanna! Eu preciso te contar! Ontem... ah Gio, foi perfeito! – Estava eufórica, o sorriso permanente em meu rosto. Eu queria contar tudo – em detalhes. Ela não me deixou continuar. - Elisa, eu sei como deve ter sido maravilhoso. Sartori não te decepcionaria. – Giovanna sabia? - Fiore, espere. Como você sabe? - Coisas aconteceram ontem, Elisa. Não acho certo falar disso por telefone. Estou indo até sua casa. – e desligou. Uma leve onda de pânico se espalhou por meu corpo. Giovanna já estava sabendo. Pensei na possibilidade de Sartori ter contado a ela, sabendo que ela é minha melhor amiga, mas essa minha melhor amiga parecia distante ao telefone, séria, quase vazia de sentimentos. Passados os quinze minutos de tensão, a campainha tocou. Gritei um "Eu atendo" para Dorotta e desci correndo as escadas, que terminavam a poucos metros da porta. Pelo vidro vi Giovanna desligar o celular. Abri a porta e ela me deu um abraço – não era como o abraço-de-todas-as-manhãs, mas era um abraço. - Venha. Guiei Giovanna para a sala de TV, onde ela se sentou no mesmo lugar onde dias atrás eu estava com Sartori. A lembrança me trouxe um sorriso no rosto. Pedi para que ela começasse. - Bem, ontem pela manhã, assim que cheguei ao colégio, - ela começou a falar rapidamente, tropeçando nas palavras, não parecia a vontade - Sartori me puxou para conversar. Ele queria que eu o ajudasse a fazer algo especial para a noite. E a gente conversou muito, enfatizando que era sua primeira noite e tudo. Só que... – ela hesitou. - Diga! - estava ficando ansiosa. - Anita estava na mesa ao lado. E ouviu tudo. Inclusive que era sua primeira noite. - Mas o qual o problema de ser minha primeira noite? - Você sabe que do nosso ano, pouquíssimos são virgens. E bom, virou piada. - Quer dizer que todo o Da Vinci Universitá está sabendo que eu ainda era virgem? Mas e daí! Não é motivo para tanta discussão. – relaxei. Era só Anita. - Você não se importa com isso? – ela parecia admirada, como se não me conhecesse. - Estou acostumada a comentarem de minha vida. Não se preocupe. Eu só pensei que seria poupada sobre esse assunto. Comecei a imaginar os apelidos que devo ter ganho dessa vez. Santa virgem, virginiana, atrasadinha... e coisinhas assim às quais eu nunca dei bola. Já eram seis da tarde e eu estava no ginásio – que já estava cheio -, para assistir ao jogo de Sartori. Avistei-o na quadra, falando ao celular, e com quem quer que ele estivesse falando, estavam discutindo. Desligou e começou a se aquecer. Vestia o uniforme da Seleção do Da Vinci, aquela regata preta ressaltava seus músculos, o short cinza revelava suas pernas bem torneadas. Ele estava lindo – mais uma vez. Eu não queria incomodá-lo, fui me sentar nas arquibancadas, o mais perto possível da quadra – Sartori sempre reservava meu lugar. Depois de ontem, nossa relação estava mais entrelaçada do que nunca, mais forte, mais séria, e eu não conseguia parar de pensar no nosso futuro. O juiz apitou, Lauro começou sacando. Tinha uns cinco minutos de jogo quando a responsável pela publicação da minha não mais virgindade, Anita, se sentou ao meu lado. Ela só foi capaz de fazer isso porque Giovanna ainda não havia chegado, porque se ela estivesse ali, aposto como ninguém me incomodaria com esse assunto – reparei que Sartori não havia reservado o lugar de minha melhor amiga, o que ele fazia sempre também. Onde estava Giovanna, então? Anita trazia um exemplar do Da Vinci Giornale nas mãos. Pensei que não publicassem coisas desse tipo no jornal da escola. Foi quando Anita resolveu falar. - Sabia que agora temos uma coluna de fofocas no Giornale, atrasadinha? – ah, que ótimo. Era realmente tudo o que eu precisava agora. - É, Anita? - Sim, e você será o nosso tema de estréia. Vocês três na verdade. - Pensei que tivesse cansado de nós. - Então é mesmo um triângulo? - Um triângulo? – agora eu tinha ficado realmente curiosa pra saber da história dela. - Ah, então você não sabe. Então é traição. Só isso. Se tivesse me dito antes, não tinha publicado só essa história aqui, tinha melhorado com a sua reação, mas deixa pra próxima. – jogou o jornal em meu colo e saiu, rindo. Eu não devia acreditar na história de Anita, pelo simples fato da história ser de Anita, mas as pessoas ao meu redor, depois de ouvir nossa conversa, me olhavam apreensivas. E se eu juntasse as peças... Não, era só mais uma historinha fantasiosa de Anita. Sartori não faria isso, não depois de ontem. A não ser que... Abri logo o jornal e procurei a tal coluna, que dizia: "Parece que é só Elisa Cobalchinni se ausentar por um dia do Da Vinci Universitá que as coisas acontecem. Ausente para comemorar seu aniversário de 17 anos, em Roma com seu pai e o namorado, Emmanuel Sartori, Elisa parece não saber do que anda acontecendo por aqui. Antes de viajar para encontrar a namorada a noite, Emmanuel Sartori foi visto constantemente com a melhor amiga de Elisa, Giovanna Menghi, com quem foi visto chegando ao colégio, almoçando e saindo juntos. Segundo uma fonte – confiável - que mora perto de Giovanna, os dois ficaram na casa dela até as cinco da tarde, quando ele foi para Roma, encontrar Elisa. O fato de ele passar a tarde na casa da melhor amiga de sua namorada fica ainda mais intrigante quando Giovanna é vista sem blusa fechando as cortinas. E depois, saindo de casa fechando os botões do mesmo artefato, para se despedir de Sartori, com um beijo muito caliente, se querem saber. Depois disso, Emmanuel Sartori sai no carro e ela procura testemunhas. Não encontra ninguém e entra em casa. É isso ai Santa virgem, não devemos confiar em ninguém. Nem no nosso namorado, porque com melhores amigas invejosas ninguém pode prever, não é? Beijinhos querida, Il Gossipy" Sartori com Giovanna. Não, claro que não. Não podia ser. Eles não seriam capazes disso. Não, jamais. Anos de amizade, anos de namoro. Era só mais uma história de Anita. Eu ainda negava em minha mente, mas a dor em meu peito revelava meu coração se rasgando em milhões de pedaços, perdidos com o tempo. A doce voz de Sartori ainda soava, perambulando em minha mente: "Andare, vista-se.". Imaginava se ele tinha dito algo parecido para Giovanna. Giovanna, minha – teoricamente – melhor amiga. As minhas mãos estavam trêmulas. Olhei ao meu redor, procurei um apoio, ou coisa assim, mas as pessoas em quem eu mais confiava causaram isso. As pessoas que eu mais amava em todo esse mundo – talvez amasse mais que a mim mesma – me traíram. E traíram juntas, me apunhalaram juntas. É – realmente – a cara dos Cobalchinni serem traídos. O ódio e a decepção chegaram até mim e ficaram, se instalaram e não tinham previsão de sair. Me corroíam por dentro, como ácido em base. Ainda me restariam esperanças se todos ao meu redor não estivessem rindo de mim, a traída. Me apontando como se eu fosse uma aberração. Estava sentada no banco da arquibancada, com o jornal nos pés, a boca aberta, as mãos tremendo, os olhos fixos no chão. Eu não podia ficar ali, naquela situação, a humilhação seria maior. Peguei o jornal, me levantei e procurei Sartori na quadra. Era a sua vez de sacar, e ele olhou pra mim. Deu o famoso sorrisinho torto – que eu ainda adorava - e pensou em piscar pra mim, se meu rosto não lhe mostrasse o que havia acontecido. Ele continuava a me olhar com uma expressão nada decepcionada, nada arrependida, talvez ele ainda não tivesse entendido. O juiz apitou. Nesse momento, dei uma última vislumbrada em seu rosto, mostrei-lhe o jornal em minhas mãos e saí. Saímos na verdade, eu e minhas lágrimas de traição. |
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